Em tempos arcaicos havia uma deusa
chamada Ceres, que tinha poder sobre a terra. Fazia crescer plantações, as
flores desabrocharem, cobria as árvores de verde, amadurecia os frutos e os
grãos. A vida na terra inteira dependia do seu zelo e perfeição.
Ceres protegia a relva e as
samambaias, todas as plantas e frutos, e mais que tudo amava sua filha
Proserpina. E a filha a amava também, era feliz e brincava com os raios de sol
nas flores, contente como o dia.
Certa vez a menina brincava no campo,
tecendo uma coroa de flores para enfeitar seus cabelos. Colhia as flores mais
belas – violetas, margaridas, lírios e miosótis.
No outro lado da campina viu brilhar
uma flor branca. Correu para lá e achou a flor mais bela do mundo. Num único
caule havia mais de cem botões. Tentou apanhar, mas o caule não quebrava.
Agarrou com toda a força e a planta saiu com a raiz.
Um barulho de trovão veio das
entranhas da terra. No lugar onde estava a planta a terra abriu-se numa fenda
que crescia cada vez mais. Do abismo surgiram quatro cavalos negros como
carvão, puxando uma carruagem feita de ouro e rubis. Sentado no resplendor da
carruagem, vinha Plutão.
Plutão era o deus dos subterrâneos do
mundo. Vivia e reinava na escuridão sob a terra, onde o Sol não brilha, não
cantam pássaros e não nascem flores. Ao ver Proserpina, achou que a presença da
adolescente, alegre e linda, traria um pouco de luz ao seu reino. Saltando da
carruagem foi até onde ela estava, pegou a jovem, levou-a para a carruagem e
afastou-se a todo galope.
Chegando ao portão das trevas,
Proserpina desesperada atirou a coroa de flores a um rio, pedindo às ninfas das
águas que a entregassem a sua mãe. As portas se abriram, a carruagem entrou e
Proserpina tornou-se prisioneira no mundo subterrâneo.
Enquanto isso, ato contínuo, na
superfície o Sol se punha e Ceres voltava dos campos. Procurou a filha por todo
o canto, mas em vão. Chamou por ela nos bosques; à noite acendeu uma tocha e
continuou a busca. A manhã chegou e sem sinal da menina.
Ceres saiu pelo mundo à procura de
Proserpina e esqueceu a parte da natureza da qual lhe cabia cuidar. As
plantações morreram, as flores murcharam, os frutos secaram. A terra ficou
estéril e o trigo não brotou, a relva amarelou, as folhas caíram das árvores. A
fome se espalhou pelo mundo e as pessoas imploravam à deusa que voltasse. Mas
Ceres estava tão longe que não ouvia os chamados só pensava na filha
desaparecida.
Até que um dia, na margem de um rio
muito largo, Ceres chorava a filha perdida quando as águas lhe trouxeram uma
coroa de flores. Reconheceu na coroa o trabalho de Proserpina e entendeu que
era um recado. Tentando adivinhar onde estaria a menina, ouviu a fonte murmurar
que no mundo lá em baixo, onde essa fonte nascia, Proserpina estava no trono ao
lado de Plutão.
Ouvindo isso, Ceres correu a Júpiter,
deus dos deuses, implorando que mandasse Plutão devolver Proserpina. A
princípio Júpiter não mostrou boa vontade para interferir com os poderes do
deus das trevas, mas as lágrimas desesperadas da mãe tocaram seu coração. Os homens
juntaram suas preces às de Ceres, implorando a intervenção de Júpiter para que
a deusa voltasse a cuidar da terra e os salvasse da morte. Os homens estavam
prestes a morrer de fome. Finalmente Júpiter cedeu.
- Proserpina pode voltar – disse ele
-, desde que não tenha comido nada no mundo subterrâneo. Assim é a Lei. Vou
mandar Mercúrio, o deus mensageiro, ao reino de Plutão.
No reino de Plutão, Proserpina
chorava. Não aceitava presentes, não provava comida. Queria voltar para sua
mãe. Lembrando-se de que Ceres oferecia à filha os frutos da terra, mandou os
servos buscarem as frutas mais saborosas na superfície. Mas a terra devastada
não dava mais alimento – nas árvores nuas não havia flores nem frutas. No
caminho de volta, porém, os servos encontraram uma pequena romã e a levaram a
Plutão.
- Coma a romã, Proserpina - pediu o
deus - Mandei buscar na terra para você!
Proserpina não tocou na fruta e
Plutão, deixando a romã perto dela, retirou-se. Mas a romã exalava um aroma tão
convidativo que Proserpina pegou-a e, com a fome que estava, levou-a a boca.
Ato contínuo, então, chegou Mercúrio.
- Não coma, Proserpina! Júpiter me
enviou para levar você para casa, mas se der uma só mordida nunca mais poderá
sair daqui. Assim é a Lei.
- Já engoli seis sementes de romã!
Disse ela.
A notícia foi levada a Júpiter, e ele
decidiu que para cada semente de romã que havia comido, Proserpina passaria um
mês no reino de Plutão.
Seis meses por ano, ela passa reinando
nas trevas ao lado de Plutão e a terra lamenta sua ausência. As flores
desaparecem, as folhas caem, os pássaros se calam e o céu chora sua partida. É
o tempo do inverno.
Mas quando os portões de Plutão se
abrem, Proserpina vem passar seis meses com a mãe e a terra inteira se abre em
flores para recebê-la. O céu torna a ficar azul, a relva verde, as árvores
explodem em botões e os pássaros entoam belas canções. É o tempo da primavera.
Fonte: O Livro das Virtudes – O
Compasso Moral. Págs. 472, 473 e 474.