Há muitos e muitos anos, um rapaz e uma moça se apaixonaram e resolveram se casar. Quase não tinham dinheiro, mas não ligavam para isso. A confiança mútua gerava a fé num belo futuro desde que tivessem um ao outro. Assim, marcaram a data pra se unir de corpo e alma.
Antes do casamento, a moça fez um pedido ao noivo:
- Não posso nem imaginar que um dia a gente possa se separar. Mas pode
ser que com o tempo a gente se canse um do outro, ou que você se aborreça e me mande de volta a meus pais. Prometa que, se algum dia isso acontecer, me deixará levar comigo o bem mais precioso que eu tiver então.
O noivo riu, achando uma bobagem o que ela dizia, mas a moça não ficou
satisfeita enquanto ele não fez a promessa por escrito e devidamente assinada.
Casaram-se.
Decididos a melhorar de vida, trabalharam arduamente e foram
recompensados. Cada novo sucesso os fazia mais determinados a sair da
pobreza, e trabalhavam ainda mais. O tempo passou e o casal prosperou.
Conquistaram uma situação estável, cada vez mais confortável, e finalmente ficaram ricos. Mudaram-se para uma ampla casa, fizeram amigos e se cercaram dos prazeres da riqueza.
Mas, dedicados em tempo integral à prosperidade financeira, aprenderam
a pensar mais nas coisas do que um no outro. Discutiam sobre o que
comprar, quanto gastar, como aumentar o patrimônio.
Certo dia, enquanto preparavam uma festa para amigos importantes,
discutiram sobre uma bobagem qualquer – o sabor do molho, os lugares à
mesa, ou coisa assim. Começaram a levantar a voz, a gritar, e chegaram
às inevitáveis acusações.
- Você não liga para mim! Gritou o marido. – só pensa em você, em
roupas e jóias. Pegue o que achar mais precioso, como prometi, e volte
para a casa dos seus pais. Não há motivos para continuarmos juntos.
A mulher empalideceu e encarou-o com um olhar magoado, como se
acabasse de descobrir uma coisa insuspeitada.
- Muito bem – disse ela baixinho -, quero mesmo ir embora. Mas devemos
ficar juntos esta noite e receber nossos amigos, para salvar as
aparências.
A noite chegou. Começou a festa, com todo o luxo e fartura que a
riqueza permitia. Alta madrugada, os convidados se retiraram e o
marido adormeceu. Ela então fez com que o levassem à casa dos pais
dela e o pusessem na cama.
Quando ele acordou na manhã seguinte, não entendeu o que tinha
acontecido. Não sabia onde estava e, quando sentou-se na cama para
olhar em volta, a mulher acercou-se da cama.
- Querido marido – disse ela -, você prometeu que se algum dia me
mandasse embora eu poderia levar o bem mais precioso que tivesse no
momento. Você é o que tenho de mais precioso. Quero você mais que tudo
na vida, e só a morte poderá nos separar.
Nesse momento, ele viu o quanto ambos tinham sido egoístas. Tomou a
esposa nos braços fortes e beijaram-se ternamente. No mesmo dia
voltaram para casa, mais apaixonados do que nunca.
O livro das virtudes, vol. 2. Pág. 461, 462.